Acredito que cada um de nós veio pro mundo pra mudar a vida de pelo menos uma pessoa. Seja como filho, como pai, como amigo, namorado ou esposo, seja como profissional ou como justo cidadão em continência as suas obrigações morais, nossa vida está sempre em atrito com outras que lhe sofrem a influência. Mas existem outras pessoas que estão aí pra mudar a vida de muita gente. Artistas, atletas, políticos… filósofos, cientistas… cujo exemplo ou pensamento são cursores coletivos. Conheci um desses de perto. Ele se chama Márcio Libar. É conhecido no Rio como um Mestre da palhaçaria. Mas para aqueles que já cruzaram o seu caminho, ele é conhecido simplesmente como Mestre.
Um dos meus grandes parceiros de música foi um rapaz que tocava gaita na Unesp, no curso de sociologia em Marília, e se chamava Pipo. Hoje ele é conhecido por meio Rio de Janeiro e se chama Marcus Matraca. O palhaço Matraca foi uma dessas revoluções irreversíveis que o Márcio Libar promoveu. Gabi minha amada, é também uma pessoa que carrega a força do encontro com Márcio Libar, ou melhor, com seu personagem "Monsieur". Eu começava a ver tudo isso de perto, meus amigos todos influenciados por um cara que a gente encontrava bebendo toda sexta-feira na saudosa roda de samba da rua do Mercado, noite adentro no Arco dos Telles. Aquela figura definitivamente não combinava com meu esteriótipo de "mestre". Com todo o respeito, seu semblante atraente lembrava mais a de um cafetão sedutor, camisa aberta, peito cheio de correntes e colares, dreadlock até a cintura e rodeado de admiradores. Não conseguia botar fé e era imediatamente criticado por aqueles lhe rendiam reverência. Então topei o desafio que me propunham: faça uma oficina de palhaço com ele e depois a gente conversa. "A nobre arte do palhaço". Vagas limitadas, turmas disputadas, num galpão do Teatro do Anônimo, fundado por ele, dentro da Fundição Progresso. Lá se vão mais de dez anos. Desde então, tiro o meu chapéu pra essa grande pessoa humana. Quer saber o que me mudou o parecer? Repasso o desafio: se tiver a oportunidade, faça uma oficina de palhaço com ele e depois a gente conversa. Em 2013 estreou um documentário chamando "Eu Maior" que interpelou uma série de personalidades cuja concepção particular do indivíduo e da vida lhes orientava a existência e influenciava muitas outras pessoas. Márcio Libar foi um dos entrevistados. Se quiser conferir o teaser de sua participação no filme, ele se encontra nesse post, logo abaixo.
"Acrobatas Epiléticos" foi criada nesse período. Apresentei a canção no fechamento da oficina do Márcio. Depois disso ele passou a me chamar de Seu Valdir nas noites de samba da rua do Mercado. Depois de gravada, ele foi lá em casa e escutamos juntos uma parte do que viria a ser o Lixo Extraordinário. O nome "Acrobatas epiléticos" surgiu da experiência de algumas apresentações de rua do palhaço Matraca e do clown que inventei pra acompanhá-lo na época, o palhaço Escopeta, a dupla se autodenominava "Os Acrobatas Piruléticos". No trânsito parado, nos semáforos do Flamengo, mostrávamos toda a nossa inaptidão acrobática. Era engraçado. Depois de deixar tudo cair no chão, saíamos pra recolher o dinheiro antes de abrir o sinal e numa dessas ganhei várias mexericas de um motorista bem humorado. A história da canção foi se construindo assim, temperando os versos com a experiência ácida vivida nas oficinas do Monsieur.
Quando começamos a discutir o arranjo em Londrina eu propus um tipo de orquestra descompassada e desafinada tal como em "Eu e minha ex" do Júpiter Maçã. Mas desafinação é palavra proibida dentro do PlayRecPause. Então, numa madrugada varada à whisky, o Filipe Barthem criou toda a base de sopros e percussão num teclado, base esta que foi sucessivamente substituída pelos instrumentos reais. Paulinho Siqueira sozinho gravou praticamente todos os sopros: sax barítono, sax soprano, fagote e flautim, ficando o trombone a cargo de Tim, um colega de metais que ele convidou. O Mizão, que me mostrava algumas idéias de guitarra pra por no final, decidiu por fim nada gravar, sendo a única música sem sua guitarra no disco. E o toque final ficou por conta da surpreendente participação da batera do Luis Marcelo. Até então não o havia visto tocar o instrumento. Bom, o Júlio só sinalizou o play e ele saiu tocando assim tal como está na canção, transformando uma quase fanfarra num bom e velho rock'n roll.
lyrics
ACROBATAS EPILÉTICOS_________________________(música e letra: batone)
Não contém acidulante, nem mesmo conservante
e ainda é doce pra danar/ sozinho pode te engasgar
com baixo teor de nicotina, anda e não gasta gasolina
se quebra é só mandar engessar/ tão logo cai, tão logo volta
agora com vocês, ele que tentou mais de uma vez
e hoje promete não falhar
pulando lá do alto dos enganos dentro de um copo americano
pra fazer toda a platéia se mijar:
os acrobatas epiléticos!
com seu porte atlético invisível, num topete conversível
ele prepara o sermão/ pra tratar do mundo cão
colocando a vida em perigo vai desatar o nó do umbigo
e muchar como um balão por amor a profissão!
respeitável público, honorável cidadão
excrementíssimo doutor, imperdoável bom cristão
quem não forte saia, quem ficar prepare a vaia
que já somos famosos por criar decepção
os acrobatas epiléticos!
quem não for forte saia quem ficar engrosse a vaia
que estamos preparados pra parar só de manhã
se o show lhes comover, é bem justo nos prover
estamos aceitando mexericas e maçãs
porque - doa a quem doer
o palhaço é ladrão de mulher!
os acrobatas epiléticos!
credits
from LIXO EXTRAORDINÁRIO,
released July 1, 2007
batone: voz
filipe barthem: arranjo de base e efeitos sonoplásticos
luís marcelo: bateria
paulinho siqueira: sax barítono e soprano, fagote e flautim
tim: trombone
júlio anizelli, gustavo potumati, rosa, mizão e luís marcelo: aplausos da platéia
gustavo potumati: vendedor de pipoca
júlio anizelli: captação do domingo no coreto da praça
produção executiva: júlio anizelli
produção musical, mixagem e masterização: júlio anizelli
direção de arranjo: filipe barthem e júlio anizelli
adaptação e orquestração do arranjo: paulinho siqueira
captação e edição: júlio anizelli
Eco-anarco-humanista, glauberiano com ascendente em escorpião.
Um ex-fantoche, um faminto índio das cavernas, um loboguará do Velho-Oeste Paulista e, antes de tudo, um ente que se quer presente.
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