O título original dessa música era "Bang-bang". Na letra falo de Gang-bang à Italiana fazendo alusão ao que foi minha escola de cinema durante toda a infância, único gênero cinematográfico no qual me lembro, eu e meu pai assistindo com o mesmo entusiasmo. Seria uma alusão longíqua, mas também não menos marcante, ao filme de Andrea Tonacci (1971) rodado em Belo Horizonte no ano em que nasci. Na última hora mudei pra "Gang-bang" por causa do apelo da letra, cheia de insinuações maliciosas. Mas confesso que esse nome hoje me incomoda. Há duas coisas que me incomodam quanto as letras do Lixo Extraordinário. Esse título e a última frase de "My heart now is rock". No pouco que mexi na composição do El Escama, acabei botando um palavrão na sua criação. Mas como ele mesmo já me disse, é a foto de um momento, de um jeito de pensar e ver o mundo. Estático é só o retrato, nós continuamos em caminhada constante, mudando os horizontes e as perspectivas.

No entanto, se botei um palavrão lá, tirei um daqui. Se bem me lembro, o argumento todo dessa canção partiu de uma frase que era repetida insistentemente - por um período, diga-se de passagem - por nosso amigo Tales Cosmos (o Arquivista). "Romântico é o cacete!" ele me dizia. Talvez pra me alertar que eu me enveredava por composições muito açucaradas. Mas o bairro do Catete sempre fez parte de meu itinerário no Rio. Impossível chegar ao centro ou voltar pra casa sem passar invariavelmente por essas quadras tão históricas quanto decadentes. Nada menos romântico que o Catete. Nada mais romântico que o Catete. Seus casarões remetendo sempre ao passado imponente dos anos do Getúlio, escancaram hoje toda a fragilidade estratégica na construção das bases da nossa República. O outrora palácio cercado da plebe embriagada - por vezes indigente - que ainda frequenta seus botecos, cais de taxistas cheios da memória sépia dos anos dourados do Rio. O Catete é hoje uma grande "Casas Bahia", lá você encontra todo o povo brasileiro. O Catete é romântico.

Originalmente ainda, essa canção era tocada no "Cassino Paissandú" (o grande apartamento que alugávamos, eu, o Edu Reginato, dois amigos do Espírito Santo (Gabeira e Adriano) e ao qual se juntou depois o Marcus Matraca, na rua homônima do Flamengo - prédio vizinho do hotel também homônimo onde Domingos de Oliveira gravou "Separações") como uma espécie de samba rock - diferente também da versão que costumo fazer ao violão, mais parecido com uma bossa. O Marcus "Palhaço" Matraca se encarregava do cavaquinho. Era um arranjo tão bom e cheio de energia que o Matraca reclamou dessa versão "alternativa" da canção. Eu gosto de todas. Mas essa especialmente traz a marca do Mizão na guitarra. Muita distorção e delays trabalhando pelo suingue da coisa, que sem saber muito explicar porque, me lembra rock japonês, ou feito pra japonês, como Sig Sig Sputnik, rs. O Bamboo se encarregou de construir a levada e na ocasião das gravações de batera, chegou de Assis com uma bateria matematicamente concebida. Foi só clicar o REC. O Alex também adicionou umas frases no teclado que lembram game antigo, tipo Atari e que acabaram dialogando com seu solo em Super, fortalecendo a coesão da sonoridade interna do disco.